sexta-feira, 10 de dezembro de 2010

Ela, efeito de uma nuvem

Numa manhã qualquer de primavera de 2010, uma nuvem sobrevoava não o mais alto céu, mas se fazia suspensa logo à altura dos meus olhos.
Surreal, mas palpável. Impossível, mas veraz. Tal nuvem era bela em seus movimentos de leveza.
Ainda distante e absorto em meu espanto, tentei dar-lhe alguma forma familiar, como quem possuísse o poder de decifrá-la e assim manter o controle sobre o que não conhece – uma relação, um símbolo, qualquer coisa para saciar um instinto tão primitivo. Em vão. Antes mesmo de começar eu já estava em desvantagem. Esta não se parecia com coisa alguma, era mesmo um enigma, um belo enigma. Devia ser apenas nuvem, tão perfeita que beirava o inconcebível, um tipo que só existe nos sonhos dos quais nos esquecemos.
Nuvens são bailarinas de um balé despreocupado, invertebrados que se arrastam suaves, ao acaso. Assumem formas impossíveis, a estética entregue ao caos e à sua teoria. São passatempos dos ventos, que com elas brincam. Encobrem o sol em brasa, suicidas, para então serem derretidas. Artes sazonais, caprichosas, instantes únicos em toda eternidade, que não ficam mais um dia, às vezes nem mais um minuto, para que possamos admirá-las. Mas esta eu quase podia tocar, quase podia sentir seu cheiro doce e sua textura lisa afável. Tão perto e tão longe. Jamais saberei explicar o medo pueril que me fez voltar e desistir da ideia de me aproximar e de tê-la. Preferi me afastar e apreciar ao longe o espetáculo de sua beleza.
Inevitavelmente, da mesma forma que ela surgiu, “do nada”, também desapareceu, sem deixar rastro. Na manhã de um dia qualquer de 2010, eu abandonei a esperança mais cedo do que gostaria. Antevendo o triste e inevitável fim, deixei minha nuvem e voltei para casa. Para que na memória ela permanecesse eterna, ainda bela. E verdadeira.

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