sexta-feira, 12 de março de 2010

A montanha (ler ao som de "A Montanha Mágica")

Dias desses, numa loja de antiguidades, avistei um quadro, uma tela já desbotada, retratando um pequeno acampamento de alpinistas no sopé da montanha que surge em segundo plano. Das quatro pessoas que formam o grupo, três estão sentadas em volta de uma fogueira, formando uma pequena roda, enquanto outra, trazendo consigo uma volumosa mochila, permanece em pé, observando a paisagem que o desafia. Gigante acinzentada com o topo alvejado pela neve, imponente e inacessível, a montanha parece ser a única coisa importante na vida daquele obcecado alpinista. Claro que, por uma simples questão de sensibilidade, ele acaba se tornando o personagem que mais desperta a curiosidade de quem observa o quadro. Talvez por estar de costas e ser o único a não revelar o rosto, quem sabe. Mas é desconfortante pensar que durante toda a eternidade aquela pessoa permanecerá ali, estática, contemplando a imponência da montanha como quem se frustra por saber que, não importa o quanto se esforce, jamais vencerá o desafio.

Pasmo, fiquei ali, pensando em tais possibilidades e, porque não, brincando de estar no lugar daquele alpinista. Imagine só, ter que escalar uma montanha como aquela mochila pesando nas costas. Seria bastante trabalhoso. Avaliando meus três companheiros de viagem, diria que o primeiro poderia ser do tipo que nem me conhece, portanto não me ajudaria. O segundo seria aquele que até gostaria de colaborar mas, assim como eu, também carrega sua mochila. O último, mais reconfortante, dividiria o peso comigo e me acompanharia rumo ao topo. Pensando bem, qualquer um deles serviria para me ajudar nesta noite, juro mesmo. Mas neste momento não existe vida por aqui. Ninguém para dizer "foda-se, se vira!", ninguém para me dar uma desculpa barata. Deve até ser por isso que estou escrevendo. O faço geralmente quando me encontro nestas condições. Na verdade nem existe uma montanha para subir, estou apenas no meu quarto. Também não trago uma pesada mochila nas costas. Mas sei que preciso chegar lá, e existe algo que me impede mais do que qualquer fardo.

Não conheço minha montanha, muito menos minha mochila. E em dias como esse, quando meu pensamento percorre rumos incompreensíveis até para eu mesmo, que eu gostaria de ser aquela pessoa feita de tinta óleo.

Um comentário:

Anônimo disse...

essas mochilas da vida também estão me matando (pesadas demais, desconfortáveis, às vezes)!
tá certo, podem não matar,
mas que angustiam, ah angustiam... bem mais do que as montanhas (que são belas, tirando a gente nelas).
abc véio!
lu